quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Crônica de um despertador espatifado

Pedro nunca tivera muito contato com Rosana. Na verdade, colegas de trabalho que eram, apenas se cumprimentavam de forma protocolar, sem beijos ou abraços, apenas ois sem qualquer entusiasmo. E assim fora, por um bom tempo, a relação. Apesar de estarem no mesmo setor, trabalhavam distantes. Ele, meio que indiferente a ela, bem como ela quanto a ele. Eram estranhos um ao outro.
Certo dia, porém, num almoço qualquer com os amigos, alguém comentara sobre a menina do sorriso grande. Sobre Rosana. Pedro, até então indiferente, reparou, não só no sorriso, mas em todo o seu corpo. E foi arrebatado. Encantou-se com aquela menina, e precisava fazer algo. Mas Pedro era estranho. Não bastasse a timidez, também tinha crises terríveis de ansiedade. Parecia impossível para ele, rapaz introvertido, sentindo o coração prestes a sair pela boca e suando por todos os poros, se declarar a alguém.
Ainda assim, sabe-se lá como, tomou coragem, chamou-a para conversar e abriu seu coração. Não criou, no entanto, qualquer expectativa quanto à possibilidade de o sentimento ser recíproco, pelo fato de ela ser casada. Ele também era, mas para Pedro, isso era um detalhe menor. Aliás, pensava diferente do senso comum. Sua fidelidade era, acima de tudo, para consigo mesmo. Com seus ideais, com sua felicidade. Jamais saía de casa pensando em cobiçar outra mulher, mas nunca descartava a possibilidade de se encontrar alguém interessante pelo caminho.
Rosana lhe disse que era impossível qualquer coisa entre os dois. Pedro não se decepcionou, já esperava a negativa. Mesmo assim, a partir daí, a relação entre os dois ficou menos distante. Não se tornou uma amizade, mas Pedro já se sentia mais a vontade para conversar sobre qualquer tema menos importante. Sua única alegria, naqueles dias difíceis de trabalho duro, era vê-la passar apressada pra lá e pra cá, sempre sorrindo.
Tempos depois, Pedro saiu do emprego, e levou consigo a lembrança daquele sorriso. Ainda conversaram algumas poucas vezes pela rede durante um tempo, sempre trivialidades, mas nunca mais ele a viu. Pensa nela dia sim, outro também, mas a distância, implacável, arrefeceu o sentimento. Até a noite em que Pedro sonhou com Rosana. Pelo menos em seu inconsciente, Pedro finalmente tinha Rosana em seus braços. Pelo menos em seu sonho, Pedro estava outra vez feliz. Mas o despertador tocou...

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Agora quem dá bola são os coxinhas

Santos perde de 8 a 0 para o Barcelona, maior goleada sofrida em 58 anos. Dia 02/08/2013. Santos perde de 4 a 0 para o Barcelona. Dia 18/12/2011. Em pouco mais de 18 meses, em dois jogos, tomou 12 gols, não marcou nenhum. Nos dois jogos não viu a cor da bola. Pior ainda, nos dois jogos, os indignos jogadores de branco pareciam maravilhados por assistir seus ídolos, aqueles que só viam no videogame. Mais pior ainda (desculpem, não achei outra expressão que substituísse o 'mais pior'), é ver que NINGUÉM está nem aí para mais esse vexame. O importante é o dinheiro no bolso e os passeios com tudo pago pelo adversário pelas praias e ramblas da Catalunha.

O NINGUÉM em questão é o tal Comitê de Gestão que comanda o clube. Quando da eleição que finalmente permitiu a troca da presidência, do mecenas rico pra caralho Marcelo Teixeira para o bonachão Luís Álvaro de Oliveira Ribeiro, o Laor, criou-se a esperança de que a situação pudesse melhorar. Melhorou, pois os títulos surgiram, os contratos de patrocínio triplicaram, o número de sócios aumentou substancialmente, as receitas de televisão quintuplicaram. Ainda havia o fundo de investimentos que aportaria pelo menos 40 milhões de reais apenas para contratar grandes craques. O futuro prometia. E olha que nessa época Neymar nem era o craque consagrado que é hoje. Porque, ao fim e ao cabo, goste-se ou não, foi ele, e só ele, que alavancou tudo isso. Se não fosse por ele, o Santos seria como... o Santos daquele do ínicio dos anos 90, com seus Arizinhos, Camilos e Pedros Paulos, Joões Fumaças e Mauricios Copertinos. Triste época...

Sem mais rodeios, a parada é a seguinte: estão acabando com o Santos. Um bando de executivos coxinhas (perdão pela redundância) supostamente bem sucedidos em suas áreas (para Laor, um grupo de 'notáveis') comandam o Santos com a frieza e a racionalidade com que comandam suas empresas. Frieza e racionalidade, bem sabemos, não combinam com futebol. Os coxinhas notáveis não contratam jogadores de nível porque a frieza dos números não permitem tais caprichos. O importante é manter o clube saudável financeiramente, mesmo que isso signifique montar times horríveis que perdem de 4 e 8 a 0 e passam vergonha em escala mundial. Pois então que se fodam os números. Se virem para arrumar a grana e montar um time, seus inúteis filhos da puta!

Até com a Vila essa corja conseguiu acabar. Há poucos anos, dizia-se com absoluta razão que jogar na Vila era um inferno, pela torcida bafejando no cangote do torcedor adversário que ia cobrar um lateral ou escanteio, pelo festival de havaianas jogadas no time rival (e devidamente devolvidos aos seus donos ao final dos jogos), pelos copos com resto de cerveja e/ou mijo e/ou bitucas de cigarro também lançados contra quem não vestisse o branco. Tudo isso morreu. Trocaram os antigos alambrados por vidros temperados de alta resistência; transformaram o caldeirão em um aquário quase inanimado. Colocaram cadeiras anatômicas no velho cimento que queimavam as bundas caiçaras e o fazia ficar em pé o tempo todo xingando os rivais, o juiz e os bandeirinhas. Onde cabiam 20 mil passaram a caber ridículos 12 mil. Acabaram com o torcedor apaixonado para constituir uma rede de clientes fidelizados caninamente, o tal sócio rei. Tudo se 'acoxinhou' pelos lados da Rua Princesa Isabel, S/N.

O Santos perdeu de 4 a 0 no Mundial, mas ganhou o dinheiro da premiação dada aos times que participaram do torneio. Perdeu de 8 a 0, mas ganhou mais dinheiro, viagem com tudo pago e exposição (negativa, claro) no mundo inteiro. Mas, pior de tudo, o Santos, time grande de uma cidade pequena, perdeu sua identidade, seu diferencial. E isso não tem dinheiro que pague. Tudo sob o comando do tal Laor. Tudo sob o comando dos 'notáveis' coxinhas sem alma e sem brio.

sábado, 11 de maio de 2013

Por nossos filhos


Que o governador, que, entre outras afrontas, nomeou como secretário particular um indivíduo que nega ter havido torturas e mortes no Brasil durante o regime militar, aja da forma como agiu, não nos causa espanto. Afinal, essa não é primeira vez que Vossa Excelência solta seus cachorros em cima de pessoas que não representam perigo a quem quer que seja. Lembremos do Pinheirinho... Enfim, não se poderia esperar outra atitude além da que foi tomada.

Que a PM tenha espancado professores, esses elementos altamente perigosos, com a valentia e coragem habitual, dando porradas em gente desarmada, despreparada para o confronto, ao contrário deles próprios, defensores da ordem devidamente adestrados e armados até os dentes, com cassetetes, spray de pimenta, bomba de efeito moral e balas de borracha também não surpreende. Afinal, essa polícia sempre primou por sua bravura, como podemos notar nos recentes confrontos com a facção criminosa que age nos presídios e nas ruas de São Paulo.



Que a mídia trate professores como vagabundos, seres dispensáveis cujo único objetivo é o de atrapalhar o trânsito da já caótica capital paulistana, é absolutamente compreensível. Não se pode esperar muito mais de quem tenta nos passar uma visão distorcida da realidade, e que por isso vê sua credibilidade ruir dia após dia, felizmente num caminho que parece sem volta.

Que nos calemos de forma cúmplice, num misto de letargia e negligência com o futuro dos nossos filhos e netos, ou pior ainda, que avalizemos tudo o que foi exposto nos parágrafos anteriores, já não é aceitável ou inteligente. Pelo contrário. Esse silêncio nos torna piores do que todos eles. Eles certamente defendem apenas seus interesses ao tomar as ações que tomam e beneficiam-se com esse cenário. Nós não. Só temos a perder, nós e nossos filhos, caso não nos movimentemos. Abracemos, pois, incondicionalmente, a causa dos nossos professores. Essa luta vale a pena ser lutada.





quarta-feira, 1 de maio de 2013

Divagações


Você me pergunta aonde eu quero chegar
Se há tantos caminhos na vida e pouca esperança no ar.
(Caminhos - Raul Seixas)

Por esses tempos, essa é a pergunta que martela a cabeça e vez por outra tira o sono: aonde quero chegar?, e que cuja resposta ainda é incerta. Mas parece que, recorrendo novamente ao auxílio do Maluco Beleza, enquanto eu vou pra frente toda minha vida atrasa. Talvez pior, pois se não atrasa, não sai do lugar. Tudo permanece inalterado, na mesma. E porque não reagir a esse momento?

Falta coragem para agir da forma certa. Mas a boca não obedece o que foi pensado e repensado diversas vezes, fria e racionalmente. Parece que não fazem parte do mesmo corpo, são independentes entre si. O fato é que alguma coisa está fora da ordem. Da ordem daquilo que foi planejado, bem ou mal, tanto faz. Há uma ponta de mágoa, mas, mais do que isso, a decepção de não conseguir mudar o rumo das coisas.

Estranho, porque contraditório, pois este seria o momento propício para mudanças. Para grandes realizações. De um lado, há a convicção baseada em absolutamente nada de que algo conspira a favor, mas de outro, há a inércia que impede de se dar um passo adiante. Há essa amarra, que prende, que limita os movimentos, que impossibilita o que seria possível se houvesse um pouco mais de esforço, de brio. Do chamado sangue nos olhos. Falta um lampejo de empenho. Talvez uma pitada de inteligência.

São divagações, algo que não tem nenhum sentido a mais ninguém, bagunçadas como um quebra cabeças daqueles difíceis de se montar; são divagações confusas, muito provavelmente apenas reflexo do momento. 

sábado, 26 de janeiro de 2013

Feliz Aniversário


Amanhã, este que vos escreve completa mais um ano de vida. Esse é o mote para o que pretendo escrever nas próximas mal traçadas linhas. Começo por dizer que aniversários são uma merda. Não pelos amigos que se lembram da data e nos mandam felicitações, muitas vezes sinceras, outras nem tanto. Muito menos pelos presentes que sempre acabamos ganhando dos nossos entes mais próximos e amigos mais chegados. Mas sim pela carga que mais um ano de vida põe em nossas costas.

Seinfeld disse certa vez, em um dos episódios da clássica sitcom que levava seu nome, que aniversários são o símbolo do quão velho ficamos e do quão pouco evoluímos. Essa premissa, por mais simples que pareça, é absolutamente verdadeira. Mas também não quero discutir o conceito de evolução (o famoso ‘subir na vida’) tão em voga nesse mundo dinheirista, aquele de conseguir um emprego melhor, a casa própria, o carro zero, ou coisa assim. Tampouco o de evoluir culturalmente, intelectualmente, de conhecer cada vez mais, sei lá, novos conceitos e teorias que podem influenciar e mudar a visão que temos do mundo e de nossas vidas. Sinceramente, não estou com saco pra isso.

Falo, sim, de algo mais simples de se perceber e de abordar: das dores que não tínhamos e cansaços que não sentíamos. Eles começam a aparecer de repente e, quando notamos, já estão tomando conta de nossos frágeis corpos (que outrora pensávamos ser de ferro). Se antes vivíamos a 200 km/h por hora, hoje não conseguimos ultrapassar a barreira dos 60 km/h. Eu, que já era um velho ‘de cabeça’ (sempre me disseram que nasci na época errada, por achar, de uma forma geral, que tudo que é velho é melhor do que as coisas de hoje), agora sou um ‘tiozinho’ também fisicamente. Um futebol com os amigos, que há poucos anos atrás poderia durar horas e horas a fio, hoje não passa da uma hora habitual. E haja remédio para dor nos dias seguintes.

Uma ridícula barriga de chope começa a dar as caras, mesmo eu sendo abstêmio; a maior parte dos cabelos já se despediu do hoje brilhante couro cabeludo, e os cabelos guerreiros que insistem em permanecer nesta grande cabeça estão embranquecidos; as articulações, especialmente as do baleado ombro esquerdo, doem quando a temperatura cai mais do que três graus. Lá no interior, aquele tio-avô que se acha engraçado diria que estou no bico do corvo. Disso, eu até discordaria, pois ainda não cheguei a esse ponto, mas como já está ficando tarde e o sono começou a bater, vou telefonar para a polícia para acabar com o samba que rola solto em frente de casa e encerrar esse pequeno desabafo por aqui mesmo.