Não que seja uma novidade, mas esses dias de Copa serviram para trazer à baila um tipo bastante comum: o constatador do óbvio. O constatador do óbvio, doravante CO, é aquele tipo que, ao ver a seleção brasileira perder um jogo, começa a fazer comparações esquizofrênicas entre o futebol e qualquer outro assunto em que o Brasil esteja em desvantagem. A Alemanha tem 78 prêmios Nobel, o Brasil nenhum; o Japão já ganhou cinco Oscars (Óscares?) de melhor filme estrangeiro, o Brasil zero; a Venezuela tem doze prêmios de Miss Universo, o Brasil necas.
Complementando essa análise deveras abalizada, o CO, por definição, sofre do complexo de vira lata, famigerada 'patologia' rodrigueana, e mal sabe o que acontece fora do seu mundinho de frases prontas. Pro CO, tudo é claro e evidente, e se resume a chavões e clichês. No entanto, ele normalmente acredita que constatar o óbvio o torna um ser diferenciado. Reconhece-se um CO a léguas de distância; se vir alguém dizer 'isso é Brasil', ou 'esse brasil (com minúsculo mesmo) é uma vergonha'. O CO acha lindo cantar o Hino Nacional aos gritos, mas não sabe o significado de 'fúlgidos', 'lábaro' ou 'plácido'. Não importa o significado do hino, o que vale é se emocionar ao ver jogadores de futebol canta-lo gritando.
O CO consegue ser contraditório, mesmo constatando o óbvio. Um exemplo claro: acha a educação do país uma porcaria, mas quando bravos professores lutam e fazem greve por melhores condições, são tachados pelos COs de 'vagabundos', 'só servem para atrapalhar o trânsito' etc. Diz que a saúde pública é uma merda, embora NUNCA tenha ido a um posto de saúde. Espalha aos quatro ventos que os impostos no Brasil são os mais altos do mundo, embora isso não esteja sequer perto da realidade. Afirma, convicto, que metroviários não podem entrar em greve porque já ganham muito bem, embora não saiba quanto um metroviário receba efetivamente como salário.
O CO, de tão óbvio, vai ler isso e vai falar: que bosta de texto. Mas não vai se dar ao trabalho de confirmar se a questão dos impostos é real ou não (acredite, é um fato). Não vai arriscar ir a uma UBS pra ver se o atendimento é ruim mesmo. Não vai se unir à luta dos professores, pois isso significaria abandonar seu universo de clichês. Afinal, o CO não pode viver sem mandar, com a boca cheia, um 'isso é Brasil' quando vir a foto de um bebê, num hospital, acomodado em uma caixa de papelão, mesmo que a foto seja de um hospital em Tegucigalpa. Afinal, o que é Tegucigalpa?, indagaria, com ar de desprezo, o constatador do óbvio.